segunda-feira, agosto 25, 2014

O passeio de canoa


Ainda hoje ouço o rumor dos remos na laguna. 
Eles cortam as águas como se escavassem a terra e separassem o amanhecer dos prodígios do dia. 
A canoa desliza lentamente entre os mangues verdes e emaranhados e a promessa do mar que fulge na foz deserta.

Os remos espalham cicatrizes na água ferida que se abre e se refaz. 
A vida não é só o rumor ou o gotejar dos remos. 
É também o silêncio aberto como um pálio sobre os corpos inclinados para a água e as almas condenadas à incerteza e ao desamparo. 

Há um tempo de falar e um tempo de calar; um tempo de dizer e um tempo de silenciar após a aprendizagem do dia e a viagem na canoa que sulca serenamente as águas da laguna e haverá de voltar ao atracadouro onde a água e a terra são verdades inseparáveis como a vida e a morte. 

Ledo Ivo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Obrigada pelo comentário...