sexta-feira, dezembro 12, 2014

Os dois horizontes


"Dois horizontes fecham nossa vida: 
Um horizonte, — a saudade ... 
Do que não há de voltar; 
Outro horizonte, — a esperança 
Dos tempos que hão de chegar; 
No presente, — sempre escuro,
— Vive a alma ambiciosa 
Na ilusão voluptuosa 
Do passado e do futuro.

Os doces brincos da infância Sob as asas maternais, 
O voo das andorinhas, 
A onda viva e os rosais; 
O gozo do amor, sonhado 
Num olhar profundo e ardente, 
Tal é na hora presente 
O horizonte do passado.

Ou ambição de grandeza 
Que no espírito calou, 
Desejo de amor sincero 
Que o coração não gozou; 
Ou um viver calmo e puro 
À alma convalescente, 
Tal é na hora presente 
O horizonte do futuro.

No breve correr dos dias Sob o azul do céu, 
— tais são Limites no mar da vida: 
Saudade ou aspiração; 
Ao nosso espírito ardente, 
Na avidez do bem sonhado, 
Nunca o presente é passado, 
Nunca o futuro é presente.

Que cismas, homem? 
– Perdido 
No mar das recordações, 
Escuto um eco sentido 
Das passadas ilusões. 
Que buscas, homem? 
– Procuro, 
Através da imensidade, 
Ler a doce realidade 
Das ilusões do futuro. 
Dois horizontes fecham nossa vida."

Machado de Assis

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