sábado, fevereiro 02, 2013

Cadeiras com espinhos


As cadeiras da minha casa têm espinhos.

Aliás, não só as da minha casa, como as de restaurantes em geral.

Ou elas apenas estão imantadas na mesma carga das minhas filhas porque cadeiras e crianças, como pólos magnéticos de mesmo sinal, se repelem.

“Senta, filha“ E filha sai.

Cada hora por um motivo diferente. Banheiro, água, buscar brinquedo, ou simplesmente para falar.

Por que criança tem que falar em pé?

Você pega a criança no colo e a coloca na cadeira. Em pouco tempo, ela vaza, escorrega para debaixo da mesa.

Você que mal conseguiu mastigar a última garfada, abaixa e a puxa para cima.

De novo. Dura pouco.

Você resolve não esquentar a cabeça e só avisa que, ao terminar, vai tirar todos os pratos da mesa. TODOS, entendeu? E ninguém poderá mais comer.

Com uma exclamação de espanto, a criança retorna à mesa correndo.

Você pensa satisfeita que bom, funcionou, só que o efeito é rápido, e criança escapole novamente.

Você não sai do lugar. Mas fala. Fala. Chama. Ignora um pouco e volta a chamar.

A irritação começa a tomar conta de você, você olha para a criança deitada na cadeira, ela olha para você, levanta os braços para a frente, faz voz de quem tá se espremendo toda e se explica.

“Tô ispiguiçando um poquinho…pa cabê mais comida“, e fica te olhando com cara lambida, sorriso guardado no canto dos lábios, o deboche se delineando no rosto da pirralha, você percebe, tem vontade de rir também mas se segura.

Se fosse na televisão, alguém ia rir, só que você não tá na televisão.

Essa cena acontece na sua casa durante as refeições e quando a gente já conhece o roteiro, ele perde a graça, mas você está decidida a não se irritar.

Busca rápido uma estratégia antes de explodir.

O que você faria se aquela criança não fosse sua?

Você bota um sorriso e diz “que-ri-di-nha“…soa falso, você ri da falsidade mas aquilo lhe dá um fôlego a mais.

Em vez de gritar, você diz “que-ri-di-nhaaaa obedece mamãe, por favor? Hum?“.

Ao olhar para o prato, você mede: faltam umas cinco colheradas. E anuncia triunfante. “Filha, vamos lá, a última“.

Aí você dá a última duas vezes, e desiste.

A criança com a boca cheia vai escorregando para fora da cadeira enquanto te fita de longe em busca de aprovação.

“Volta e só sai com a boca vazia!!!“ A criança senta e mastiga rapidinho.

Aí abre a boca e pede. “Posso sair agola?“

Claro que vai aparecer alguma supernanny de plantão pra me dizer que eu preciso disciplinar melhor minhas filhas, que se elas não têm educação tiveram a quem puxar.

Obrigada, amiga, eu precisava ouvir isso. Mas o fato é que crianças não gostam de ficar sentadas. Nem em almofadas. De repente se eu tentar um velcro…




    Isabel Clemente é editora de ÉPOCA


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