domingo, maio 15, 2011


Bom Domingo Comentando!






Escravo da net


Vieram lhe convidar para um chopp,
o programa não lhe percebeu muito interessante.
Quem mais ira?
Seria em qual bar?
A noite estaria fria?
Ah...melhor ficar em casa, pensou ele.
Lá, entre aquelas quatro paredes, havia uma grande companheira que não lhe exigia que tomasse um super banho, nem colocasse uma bonita roupa, nem passasse um agradável perfume e depois ainda tivesse que articular palavras e sorrisos.

Pensando assim, em casa ficou, como na maioria dos dias dos últimos quatro anos de sua vida.
Amarrado a uma cadeira, hipnotizado por uma tela de computador e trocando idéias com inúmeras mulheres que não conhecia e que provavelmente, muitas delas, nunca viria a conhecer.

Com o passar do tempo, quilos foi ganhando. No corpo e na mente, um acúmulo de gorduras se formando.
Alguns pequenos problemas de coluna também foram surgindo, dores nas pernas, inclusive. Claro, aquela vida sedentária começou a dar os seus primeiros sinais.

Era um entra e sai em salas de bate-papo, uma busca incessante sabe-se lá de que. Sempre cumpria o mesmo ritual:
Seu nome?
Idade?
Estado civil?
Altura, peso (detalhe importante)
Procuras o que por aqui? O mesmo que eu?
(Se bem que ele nem sabia o que procurava)

Escravos da Internet não sabem exatamente o que procuram,
se um amor ou inúmeras aventuras ou quem sabe até, a fuga do mundo real.

Criava coragem para levantar daquela cadeira só para sair com uma hoje, outra amanhã
e sempre muito orgulhoso do volume de mulheres que conseguia conquistar.
Mas será que conseguia mesmo?

Colecionava fotos numa pasta que criou em seu micro na qual colocou o nome de "ELAS",
com algumas subpastas é claro - feias, bonitas, altas, baixas, loiras, morenas, casadas, solteiras, gordas, magras, novas, velhas.

Em nenhuma dessas mulheres deixava rastros, com nenhuma construía laços.
Eram cinqüenta saídas inúteis para uma agradável, mas a que se fazia agradável,
em muito pouco tempo se tornava desinteressante, porque a ânsia de conhecer outras não permitia que ele se detesse em nenhuma.

Do alto dos seus quarenta aninhos, transformava-se em um garoto de dezoito ao perceber que para a sua lista de conquistas arrematou uma de vinte.
Na verdade, nem conseguiu ver suas qualidades, apenas que ela possuía pouca idade, motivo de glória para ele essa conquista, era como se fosse um troféu.

Com o tempo também, a Internet foi lhe roubando certas coisas, como por exemplo,
o senso do ridículo, o discernimento entre o viável e o inviável, a dignidade, o entendimento do que é ser um homem de verdade,
o sabor de amar, o prazer de realmente fazer amor.
A Internet foi capaz até, de nele, passar uma borracha naquela linha divisória
que existe dentro de cada um de nós, que separa a realidade da ilusão, a verdade da mentira.

Ele acredita piamente que escolhe suas conquistas, que determina as mulheres que quer,
não percebe que é ele quem está por todo o tempo estagnado no mesmo lugar e elas é que passam por ele por períodos rápidos até chegarem ao seu destino.
Ele, no entanto, não tem caminhos a seguir, vive como árvores na beira da estrada ,
que vistas da janela de um carro em movimento passam como um flash ...

Amigos? Foi abrindo mão de todos...
Calor humano?
Não sabe mais o que é isso...
Sinceridade, realidade? Esqueceu o que é...
Fazer amor, com cada parte do corpo, com alma, coração,
derramando por cada poro gotas de desejo?
Não se recorda mais como é isso...

Hoje ele faz sexo com letras e também com corpos que minutos depois nem se recorda mais do cheiro, nem mesmo o gosto do beijo...

Há uma coisa na vida que não se pode recuperar - o tempo perdido - mas em algum momento todos sempre se dão conta disso e tentar regressar no tempo é a parte mais sofrida da vida de um ser humano, porque ele acaba descobrindo que não existe trem de volta, todos seguem sempre em frente e na maioria das vezes, velozes.

Dependente químico da Internet, foi isso que ele se tornou
e com isso algumas vezes passaram por ele mulheres que valiam muito a pena,
mas coitado, ele nem conseguiu perceber, não teve tempo,
assim como provavelmente também não terá tempo pra ler esse texto.


(Silvana Duboc)



Sol Hoffmann

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